Saúde no Distrito Federal: entre o diagnóstico e o dever

Há momentos em que os números falam mais do que slogans. E, quando falamos da saúde no Distrito Federal, é preciso olhar esses números não apenas como estatísticas, mas como sintomas de uma urgência moral.

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Por Evandro Araújo

Há momentos em que os números falam mais do que slogans. E, quando falamos da saúde no Distrito Federal, é preciso olhar esses números não apenas como estatísticas, mas como sintomas de uma urgência moral.

Apenas 20% da população do DF está coberta pelo Programa Saúde da Família. Trata-se de uma das piores coberturas do país em atenção primária, e isso nos diz muito. Significa que a imensa maioria da população recorre diretamente às emergências, agravando a superlotação dos hospitais e deixando de lado a medicina preventiva, que é o alicerce de qualquer sistema de saúde sustentável.

Quando a porta de entrada está fechada, todos se aglomeram na saída. Não é surpresa, então, que 64% dos hospitais da capital federal estejam sistematicamente lotados, com a média de leitos (2,3 por mil habitantes) abaixo do recomendado pela Organização Mundial da Saúde. As consequências são conhecidas por todos: filas, atrasos em atendimentos, aumento do risco de infecções hospitalares e, por vezes, a perda daquilo que não se pode restituir — a vida.

Mas o desafio é ainda maior. Em 2024, os casos de dengue aumentaram em impressionantes 646%, somando mais de 17 mil notificações. A combinação de urbanização acelerada, mudanças climáticas e lacunas nas políticas de prevenção contribui para esse cenário. O mesmo vale para doenças como tuberculose e AIDS, cuja persistência denuncia as falhas na vigilância sanitária e no acesso contínuo ao tratamento.

Diante desse quadro, é fácil cair na crítica vazia ou no discurso simplista. Mas esse não é o caminho. O que está em jogo não é a disputa política — é a saúde de mães, pais, idosos, crianças. É a dignidade de quem espera por atendimento com dor e incerteza.

É necessário reconhecer: a raiz do problema não é apenas administrativa. É também cultural e estrutural. O subfinanciamento da saúde pública, somado à ausência de um planejamento de longo prazo e à falta de continuidade nas políticas públicas, tem sido um veneno lento, mas constante. Propostas como o Saúde+10, que buscavam garantir mais recursos obrigatórios para o setor, ainda não saíram do papel — e o tempo não perdoa quem posterga o que é essencial.

No entanto, não basta apenas mais recursos. É preciso gastá-los com inteligência, foco e responsabilidade. A saúde precisa deixar de ser uma arena de disputas partidárias e se tornar uma política de Estado. Isso exige vontade política, sim, mas também espírito público, competência técnica e uma visão de longo prazo, que enfrente as causas antes que os sintomas nos asfixiem.

Como jovem que acredita na ordem, no dever e na dignidade da vida humana, faço um apelo: que os debates sobre saúde deixem de ser jogados ao sabor de narrativas passageiras. Que a responsabilidade vença o improviso. E que as decisões públicas, enfim, se orientem pelo que é justo, eficaz e moralmente inadiável.
A saúde do Distrito Federal não é um problema apenas do governo de hoje. É uma dívida acumulada com o futuro — e só poderá ser quitada com maturidade, planejamento e trabalho.

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